No último sábado (27 de junho), uma ex-fã de Sharon Needles, campeã da quarta temporada de RuPaul’s Drag Race, foi ao twitter expor inúmeros abusos que afirma ter sofrido da drag queen quando ainda era adolescente. Annecy, a suposta vítima de Sharon que se identifica como homem trans, era um fã bem conhecido entre as rainhas e fandom de RPDR, pois ele sempre comparecia aos eventos e shows estrelados por Sharon, além de ter um tumblr muito conhecido dedicado a rainha das trevas. A seguir todo relato traduzido da experiência de Annecy, que foi publicado aqui.
ATENÇÃO, aviso de gatilho: auto-agressão, aliciamento de menor, racismo, gordofobia, doença mental, uso de drogas e álcool, suicídio.
“Sharon Needles (ou Aaron Coady), conhecida por vencer a quarta temporada de RuPaul’s Drag Race, era meu herói quando eu tinha entre 13 e 17 anos. Começamos a nos tornar amigos quando eu tinha 15 anos, e ela me deu algumas das experiências mais incríveis da minha vida. No entanto, ao longo dos anos, eu também tive que aceitar que ela é uma pessoa tóxica, manipuladora, predatória, racista e abusadora física e mentalmente. Há anos que brigo comigo mesmo, porque ainda me preocupo com ele e quero me culpar por tudo que deu errado. Mas quando imagino que qualquer outra pessoa entre 15 e 17 anos que tenha tido o tipo de amizade que tive com um homem de 31/33 anos (queer ou não), especialmente um como Aaron Coady, me sinto doente.
Eu estou tão perto de estar pronto para me abrir e contar ao mundo tudo o que ele fez comigo e o quanto ele me feriu, mas eu sempre me viro e fico impressionado com o que parece ser uma forma de síndrome de Estocolmo, mais uma carga enorme de culpa. Não é uma verdade que eu queira encarar. Não quero admitir que alguém que eu admirava durante um dos momentos mais sombrios da minha vida, que de repente encheu minha vida com oportunidades inacreditáveis e me colocou sob seu poder como amigo e mentor, seja uma pessoa tóxica. Eu ainda me culpo por deixar essas coisas acontecerem, mesmo sendo adolescente. Às vezes, sinto que algumas de minhas experiências nem são válidas porque Aaron é um homem gay e eu me identificava como uma garota naquela época. Além disso, tenho meus próprios problemas pelos quais preciso me responsabilizar a partir desse período da minha vida. Mas ler inúmeras histórias ultimamente de figuras públicas sendo abusivas que parecem tão familiares às minhas próprias experiências tem sido um gatilho forte. Sabendo que não há como evitar ouvir sobre ela ou ver seu rosto, porque ela é uma figura pública tem sido estressante desde antes de eu aceitar que ela era abusiva. Tentei me concentrar nas memórias positivas que tive com ela e continuei apoiando-a quando começamos a nos tornar amigos novamente no final de 2017. Tentei discutir isso em terapia e manter meus sentimentos em sigilo, mas minhas tentativas de permanecer em silêncio quando ela é uma figura tão pública acabou adicionando mais dor. Levei anos para me abrir sobre isso com um terapeuta, porque senti que tudo era minha culpa. Eu não queria que as pessoas menosprezassem Aaron. Tudo isso literalmente dói fisicamente, até mesmo para pensar.
Eu luto com essas conclusões de como ele me tratou desde os 19 anos (hoje tenho 22) e nem conseguia admitir que ele pudesse ter feito algo errado até então. Descobri a personalidade drag de Sharon aos 13 anos, nos tornamos amigos aos 15 e brigamos aos 17 anos. Mesmo depois que paramos de falar, senti que não podia culpá-la por nada. Acabei vendo-a alguns meses após a nossa briga e ela me levou para o seu camarim. Quando ela me disse “você engordou”, recitou sua bordão “corte mais profundo“ e disse a todos na sala que eu provavelmente me mataria naquela noite e eu apenas concordei com ela. Eu decidi que Aaron estava certo, e esse era um amor duro. Achei que merecia aquilo.
A primeira coisa que me lembro de Aaron que me machucou aconteceu antes de nos conhecermos quando nos tornamos amigos no aplicativo Vine no verão de 2013. Eu tinha 15 anos e um dia fiquei realmente suicida e tentei tomar uma overdose de ‘certo remédio’ [nome do medicamento ocultado]. Acho que minha boca grande disse para alguém, que disse para o Aaron. Mais tarde naquela noite, recebi vídeos no Vine de Aaron montado de Sharon gritando “engula mais pílulas Annecy” e zombando de mim por ser suicida. Mesmo que doesse, eu apenas me deixei ficar chocado e acreditando que aquilo era sua forma de amor duro. Eu encontrei um vídeo meu quando eu tinha 15 anos falando sobre um telefonema que tive com ela naquela noite, zombando sobre como ela me disse que eu precisava continuar tomando as pílulas porque eu estava vivo e não estava funcionando e que o suicídio era bonito e que eu era um idiota. Tentei racionalizar dizendo que eram elogios dela. Isso não muda o fato de que, sempre que eu tinha espirais depressivos, ouvia ecos dela me dizendo para tomar mais pílulas quando eu era suicida, e a usei como inspiração para me machucar mais do que antes quando eu me machucava.
[A jovem publicou um vídeo da Sharon a incentivando a se suicidar quando tinha 15 anos de idade, mas por questão de saúde pública não o compartilharei aqui.]
Alguns meses antes, de alguma forma, consegui ser convidado para um cruzeiro com tema de Drag Race, depois de ganhar o segundo lugar em um concurso, após explicar o quanto drag me ajudou a lidar com a depressão. O cruzeiro ocorreu no final de novembro de 2013 até o dia seguinte ao meu aniversário de 16 anos (6 de dezembro). Eu conheci Aaron pela primeira vez em um hotel um dia antes do cruzeiro zarpar. Eu acredito que o primeiro dia do cruzeiro Aaron me levou para o quarto dele e nós saímos. Ele pegou um pouco de maconha e eu disse a ele que minha mãe certa vez soprou maconha em meu rosto para me acalmar de um ataque de ansiedade. Aaron me convenceu a participar, mas em vez de apenas soprar uma pequena quantidade no meu rosto, ele inesperadamente e bastante agressivamente pressionou sua boca na minha e soprou muita fumaça na minha boca. Na época eu sequer tive meu primeiro beijo ainda e um homem de 32 anos estava soprando drogas em mim boca a boca. Eu apenas decidi que era engraçado e simulei de forma exagerada que fiquei enojado para fazê-lo rir. Um pouco depois, comecei a contar o quanto ela significava para mim e decidi ser brega e mostrar-lhe minhas cicatrizes de auto-mutilação. A reação dela foi algo como “não me mostre isso; você fez errado de qualquer maneira” (dando a entender que deveria fazer de outra forma para se matar). Uma das coisas favoritas dela para me dizer depois desse momento foi “corte mais profundo”. Alguns minutos depois que eu mostrei a ela, não me lembro exatamente o que ela disse, mas ela começou a rosnar algo envolvendo “Eu sou a mãe da Sharon Needles, porra” e me montou com as coxas em volta do meu pescoço e a virilha me apertando até o ponto que eu me senti enforcada. Ainda me lembro da sensação do jeans dela no meu pescoço. Essa foi a única vez que alguém me impediu de respirar.
No dia seguinte, eu estava andando sozinha pelo cruzeiro, nervoso e desajeitado, e encontrei Michelle Visage com algumas outras rainhas e pedi para sentar com elas e elas me deram as boas-vindas. A primeira coisa que saiu da minha boca em nossa conversa foi “Sharon me deu drogas”. Eu estava convencido de que era inocente e inofensivo e Michelle ficou muito chateada, embora eu tentasse dizer que era “apenas maconha”. Acho que Aaron teve problemas, mas acho que a World of Wonder (produtora de Drag Race) o deixou com um aviso; no entanto, ele estava muito bravo comigo. Eu me culpei literalmente por anos depois disso e senti muita raiva de mim mesmo, apesar de ter 15 anos e ser imaturo. Eu dizia às pessoas que me perguntavam que as drogas em questão eram “pizza” para protegê-la (Michelle mencionou isso em uma entrevista uma vez, para que as pessoas me perguntassem muito sobre isso). Durante todo o cruzeiro, ele era brincalhão enquanto estava sóbrio, mas quando a noite chegava e ele começava a beber e ficava assustado com isso.
Acho que essa noite pode ter sido a primeira vez que ela tentou me fazer beber álcool, embora ele tenha insistido tanto que é possível que já tenha tentado previamente outras vezes durante aquela semana. Sharon percebeu que eu não gostava do gosto do álcool e me convencia a tomar um gole de álcool, e eu sempre cuspia e agia com repulsa. Eu não sei se ela estava falando sério sobre tentar me fazer beber, mas aconteceu várias vezes dela não parar de me pedir para tomar suas bebidas até eu tomar um gole. Lembro-me dela me fazendo experimentar uísque, tequila, uma garrafa de cerveja Heineken e champanhe. Lembro-me de quando ela me deu a Heineken, insistiu que eu me certificasse de engoli-la. Eu acho que aconteceu mais do que apenas naquela época, mas faz 5-7 anos, então minha memória está embaçada. As baforadas de maconha eram comuns e aconteciam quase todas as noites. Eu tenho uma selfie segurando uma das bebidas que ela me levou a experimentar, um vídeo meu cuspindo champanhe em cima de mim mesma que ela me fez experimentar no meu aniversário e uma selfie em que você pode ver o batom dela na minha boca das nossas baforadas.
Acredito que nessa mesma noite em que estivemos no quarto dela, ela se desmontou da drag e, sem aviso prévio, colocou o pau para fora. Eu me virei e gritei e cobri meus olhos (isso foi tipo um dia depois que Alaska colocou seu pau para fora na minha frente quando ninguém mais estava por perto e disse “oh, 15 anos, eu não deveria ter feito isso” enquanto estava sóbrio, mas isso é outra história. Eu vi meus dois primeiros pênis na vida real separados por um dia de diferença um do outro, aos 15 anos sem consentimento e eles eram homens crescidos). Aaron ficou tipo “você deveria ter desviado o olhar”, então eu me culpei. Mais tarde naquela noite, eu estava saindo com Aaron e ele estava muito bêbado e fumando um cigarro, e ele basicamente ficou olhando para minha alma dizendo “por que você contou a Michelle” e sei lá do jeito que ele disse e olhou para mim foi literalmente assustador. Ele usou isso contra mim a semana toda. A ordem dos acontecimentos está confusa, mas eu tenho uma lembrança dele brincando com meus peitos um dia durante um Meet & Greet (ele sabia muito bem que eu tinha 15 anos). Por muito tempo eu achei que isso era normal, porque isso acontecia constantemente com as garotas de Drag Race (que também conheciam minha idade), então eu acho que aconteceu com ele mais do que me recordo.
Outra noite no cruzeiro, ele ficou extremamente bêbado e me deu um soco muito forte, acho que no braço, mas eu estava de boa. Essa não foi a única vez que ela teve contato físico comigo nas poucas vezes em que passamos um tempo juntos (há um vídeo do meu aniversário no cruzeiro em que ele me bateu muito forte na coxa com uma faca que deveria ser brincadeira, mas eu ainda lembre do que senti. Eu acho que ele me bateu alguns anos depois no Battle of the Seasons em 2015 também, mas minha memória daquela noite está enevoada). Naquela mesma noite no barco, quando ele estava tão bêbado, ele teve que ser carregado para o seu quarto e me trouxe com ele. Eu acho que tive que carregar os sapatos dele. Não sei se devo me abrir sobre isso, mas acho que, porque isso aconteceu entre pessoas de 15 e 32 anos, vale a pena pontuar. Ele tinha terminado recentemente com Alaska (outra razão pela qual me sinto realmente culpado por postar sobre isso porque sei que ele estava deprimido durante esse período) e estava na varanda olhando a água e começou a conversar comigo sobre como o afogamento seria a melhor maneira de morrer. Ele subiu no parapeito e sentou-se nele, colocando-se em risco de cair do barco. Eu surtei e tive que agarrá-lo e gritar para que seu amigo viesse ajudar… Eu tinha 15 anos tentando salvar meu ídolo de pular de um navio de cruzeiro.
Ao longo da semana, Aaron ficava bêbado e constantemente drogado (e os usava na minha frente). Ela me mostrou o que eram poppers, usou molly na minha frente, bebeu sem parar, fumou maconha de uma lata de cerveja, soprou fumaça de cigarro na minha cara e me fez pisar em seus cigarros. Após o cruzeiro, começamos a fazer muitas ligações de vídeo e ela estava constantemente bêbada e costumava usar cocaína. Ela fumou algo de um cachimbo de crack uma vez, quando eu saí com ela uma noite em 2014, aos 16 anos. Não desprezo as pessoas que usam drogas, mas não acho que as pessoas devam fazê-las na frente das crianças ou incentivá-las para se juntar a eles. Existe uma dinâmica de poder tão desigual em tudo isso. Ela fazia xixi com a porta aberta perto de mim. Não sei se isso é estranho ou não, mas foi uma surpresa para mim e me fez sentir estranho. Na última noite do cruzeiro, ela me fez andar com ela por cerca de 30 minutos, enquanto ela ficava bêbada e se agarrava com cada cara que encontrávamos.
Após o cruzeiro, fazíamos videoconferência constantemente e eu pude fazer uma peça teatral com ela em San Francisco. Ela fez muito por mim, mas dói ter que pensar em todas as coisas dolorosas que ela fez comigo que eu tenho que tentar entender.
Algumas outras coisas que aconteceram:
Um homem hétero de quem ela costumava ser amiga e que de forma suspeita passava muito tempo ao meu redor no cruzeiro me mandou uma mensagem uma semana depois do cruzeiro sobre o quão louco era eu ser virgem. Eu contei a Aaron e pedi a ele para não contar a ninguém. Não sei se é realmente algo para culpá-lo, mas sinto que os adultos deveriam agir muito mais se descobrissem que alguém que eles conhecem está aliciando uma criança.
Uma noite, no FaceTime, quando eu tinha 17 anos, ela ficou me perguntando para o que eu me masturbava e tentei de verdade não responder a essa pergunta e mudar de assunto, mas ela continuou falando sobre isso. Eu disse a ela que só pensava em nuvens. Eu não sabia o quão estranho era realmente para um homem adulto me perguntar sobre aquilo, mas eu estava muito desconfortável. Eu tenho capturas de tela dela me perguntando isso na época (janeiro de 2015).
Uma vez, quando eu tinha 16 anos, ela me convenceu a parar secretamente de tomar meu Prozac por algumas semanas, porque, de acordo com as pílulas dela, era ruim ou me deixava louco ou algo que me deixava muito mal e me fazia ter pensamentos ruins por um bom tempo. Em resposta ao seu conselho, escondi minhas pílulas na gaveta da mesa de cabeceira, em vez de tomá-las.
Ela mentia com frequência e me obrigava a parar de falar com alguns dos meus amigos e me desencorajava de ser fã de outras garotas de Drag Race.
Ela me enviou nudes de outro adolescente (um menino) que ela era amiga e tinha 17 anos na época.
Ela cometia gordofobia contra mim, me envergonhando na frente de muitas outras pessoas.
Ela deu um tapa ou apalpou minha bunda pelo menos uma vez quando eu tinha 16 anos (durante um ensaio na peça de teatro que fizemos).
Eu testemunhei ela ser cruel e falar merda sobre fãs, pessoas que não gostavam dela e pessoas em geral quase diariamente em alguns momentos.
Ela me disse algumas vezes para me cortar nos padrões de argyle, o que eu fiz quando tinha 16 anos.
Em algum lugar, existem vídeos dela comigo quando tinha 16 anos, nós falando via Skype, em que ela me fez agir como se fôssemos franceses nos beijando com a língua.
Ela e suas amigas constantemente faziam abuso psicológico comigo e me faziam sentir horrível quando eu estava triste, e eu apenas aceitava como verdade todas as coisas insensíveis que eles me diziam. Eu questionava o que tinha feito e dito e eles me diziam que estava tudo bem e me incentivavam a continuar.
Eu bloqueei muitas coisas que ela fez e me disse, mas a maneira como ela conversou comigo e interagiu comigo era tão inadequada para uma pessoa de 31/33 anos ou qualquer adulto estar conversando com uma pessoa de 15/17 anos ou qualquer menor de idade.
Eu preciso tirar essa ansiedade com Aaron do meu peito, mas, ao mesmo tempo, sinto a necessidade de me responsabilizar pelos meus defeitos, se eu quiser expor-lo. Nosso desentendimento aconteceu porque lutei para ser digno de confiança durante nossa amizade. O principal incidente que a levou a me cortar [de sua vida] foi quando eu tinha 17 anos – involuntariamente, deixei uma demo dela vazar de seu novo álbum. Ela tinha me enviado algumas músicas de seu seu próximo álbum e eu decidi fazer um videoclipe para uma das músicas e fiquei muito empolgado com isso. Um dia eu estava conversando com outro fã em quem pensei que poderia confiar e acabei enviando a ele o videoclipe que eu fiz. No dia seguinte, a música acabou no Reddit. Aaron ficou furioso e eu aprendi uma lição importante. Pedi desculpas várias vezes e ainda sinto muito por isso.
Algo que fiz foi ainda pior: ela me deu suas senhas para várias contas, incluindo o Twitter e, um dia, enquanto eu estava enviando mensagens, o que costumava me fazer perder completamente a cabeça, entrei no twitter e deixei de seguir um fã de quem eu estava com ciúmes. Alguém com de 17 anos deveria saber melhor, mas eu realmente acredito que muitas coisas, incluindo minhas lutas de saúde mental, me impediram de ter uma quantidade razoável de bom senso e me deixaram muito impulsivo, mas por favor, não pense que estou tentando dar desculpas. Acabei enlouquecendo a semana inteira depois que fiz isso, e finalmente confiei e estendi a mão para Aaron e pedi desculpas. O que eu senti falta de fazer foi me desculpar pessoalmente com o fã, mas eu estava com muita vergonha e medo de admitir isso. Ainda sinto muito por fazer algo tão mesquinho e imaturo, e se tiver a chance de me reconectar com esse fã, gostaria de pedir desculpas em atraso.
Apesar de todas as formas pelas quais Aaron me tratou, a coisa sobre essa amizade que mais me perturbou foi o meu próprio comportamento. Aaron me convencera de que ele era a pessoa mais inteligente que eu conhecia. Eu acreditava que ele não podia fazer nada errado e que tudo o que ele dizia estava certo. Aaron e seus amigos se divertiam muito com o “choque de valores“. Sua definição de “choque de valores” eram piadas racistas, piadas gordofóbicas, piadas capacitistas, piadas transfóbicas, piadas sexistas, piadas anti-semitas, piadas sobre AIDS, piadas assustadoras – todas as piadas de merda que você poderia imaginar.
Aaron amava a palavra ’n’ [nigg*, insulto racista contra pessoas pretas]. Ele achava racismo engraçado. Ele achava o blackface engraçado. Ele amava insultos. Ele constantemente me incentivava a repetir depois dele. Quando eu perguntei se ele realmente queria dizer essas coisas, e se era realmente bom dizer tais coisas, ele me dizia “as palavras não têm significado/poder, a menos que você as dê”. Ele tinha o dobro da minha idade (eu tinha 16 anos quando agia assim, mas ainda assim me envolvi um pouco mais quando tinha 17 anos, embora eu esteja plenamente ciente de que deveria ter idade suficiente para saber agir melhor), um adulto, queer (eu estava sob a impressão de que ser queer significava que você não podia ser preconceituoso, sim, eu sei agora que isso é obviamente muito ignorante e falso), e alguém que eu pensei que admirava que me inspirava tanto e me elevava de tanta escuridão me fazia acreditar que ele estava certo.
Então, tenho que admitir que falei muito a palavra ’n’ e outras coisas perturbadoras durante esse período. É muito embaraçoso e vergonhoso admitir isso, mas não posso continuar dizendo que vidas negras são importantes quando estou sentado nas lembranças de mim participando de um comportamento racista. Um dia, quando eu tinha 16 anos, disse a palavra ’n’ nas mídias sociais e recebi como troco revolta justificada. Aprendi tarde demais que eu ser uma pessoa branca usando essa palavra era um ato de violência. Pedi desculpas quando fui colocado no meu lugar, mas ainda sinto muito. Se alguém lê isso e está magoado ou com raiva de mim, você tem todo o direito de estar. Espero que você possa me perdoar, mas não espero que você ofaça, e não importa quais sejam as circunstâncias, é completamente desnecessário sentir alguma necessidade de me perdoar. Estou com raiva de mim mesmo há cinco anos e, mesmo que as pessoas me perdoassem, não acho que poderia deixar de lado a culpa que sinto por isso. Tudo o que posso fazer neste momento é me responsabilizar, trabalhar para ser melhor, adotar medidas para ajudar o mundo à minha volta, pagar reparações e crescer.