Confesso que quando anunciaram o lançamento de Caravana das Drags fiquei um pouco cético. Não por não acreditar no projeto, mas por estar um tanto quanto saturado de competições drags, graças a RuPaul’s Drag Race e suas várias franquias pelo mundo que criou uma fórmula vencedora, mas já desgastada. Episódios demais, dramas demais, injustiças demais. Mas sigo forte, porque amo arte Drag e acredito que ela sempre deverá ser enaltecida, pois o que importa de verdade é celebrar esses artistas drags que tanto fazem, as vezes, com tão pouco.
Então, quando estreiou Caravana das Drags estava sem expectativas, mas esperançoso para ser surpreendido. E, gente, como fui agraciado com uma proposta de programa já conhecida, porém fresca.
COMPARAÇÕES COM DRAG RACE
Sei que é inevitável as comparações com Drag Race e sejamos justos, não tem como não assistir ao programa nacional e não lembrar do show de RuPaul. Mama Ru abriu portas e colocou a arte Drag no mainstream e isso é louvável. Muitas drags brasileiras da nova geração surgiram inspiradas em RPDR, tipo Pabllo Vittar que já declarou várias vezes o tanto que o programa a inspirou.
Entretanto, a arte Drag brasileira é original e pioneira em muitos aspectos, tendo um jeitinho todo nosso de ser. Por isso é até injusto vários apontamentos de “cópia” de Drag Race que tenho lido e visto desde que o programa estreiou. É preciso entender que estamos falando de uma competição televisiva, que tem uma estrutura similar a todas as demais competições do mesmo tipo, seja ela de convivência, relacionamento, canto ou culinária.
Drag Race é um fenômeno cultural que fez sua contribuição à cultura pop, mas é chegada a hora de abrirmos nossos olhos para além das produções estrangeiras e focar e enaltecer o que é nosso. E é nisso que Caravana das Drags se sobressai. Pois com a premissa de viajar pelo país num ônibus cheio de drags, Xuxa e Ikaro Kadoshi acompanhadas de rainhas talentosíssimas nos apresentam as maravilhas de nosso Brasil a partir do olhar de artistas queer. Chega de só conhecer o país pela premissa heteronormativa, agora é hora de nos vermos representados na TV pelo olhar de nossos semelhantes LGTBQIA+.
A CARAVANA DAS DRAGS
Caravana das Drags é uma competição brasileira que viaja pelo país com dez rainhas que se apresentam em cidades diferentes para ao fim da turnê uma ser coroada a SOBERANA DA CARANAVA. Apresentado pela eterna rainha dos baixinhos, Xuxa, e pela lendária drag queen Ikaro Kadoshi, o programa tem em seu primeiro elenco Chandelly Kidman, DesiRée Beck, Enme, Frimes, Gaia do Brasil, Hellena Borgys, Morgante, Ravena Creole, Robytt Moon e Slovakia.
PONTOS NEGATIVOS
De cara já vou pontuar meus incômodos, para deixá-los na entrada e focarmos no que importa, a arte Drag brasileira.
Meu grande problema com a Caravana nesses três primeiros episódios foi com a edição e algumas decisões de roteiro. Caravana é exibido pela Prime Vídeo, logo, não vejo a necessidade de episódios curtos de 40 minutos. Vamos ser ousados, um episódio de 60 minutos tem muito mais a aproveitar da arte drag. E assim poderemos desfrutar de verdade das performances de cada rainha.
É uma grande sacanagem fazer um desafio de bate cabelo em que o bate cabelo acaba ficando em segundo plano. Permitam que as drags mostrem suas habilidades batendo o picumã, e assim a gente possa, de fato, julgar, as que foram boas ou não. Da forma que foi apresentado no primeiro episódio não ficou bom e sequer dá para fazer uma análise justa das decisões dos jurados, pois não temos muito material em que embasar nossa opinião. Dito isso, tragam Slovakia de volta!
No segundo episódio senti o mesmo problema de edição, em que as drags fizeram um show de comédia, mas pouco se mostrou de cada uma, foram bem poucas aquelas que tiveram seu ato melhor apresentado. Mesmo que as demais não tivessem tantas piadas é importante que a gente veja mais de cada apresentação para que as críticas dos jurados façam sentido.
E por fim chegamos nele, o coadjuvante até aqui, o ônibus. Se o mote do programa é uma caravana itinerante, esperava que o ônibus rosa choque das drags tivesse mais destaque. Ele aparece no começo, chegando na cidade, e no fim, ao sair da cidade. Ou no fundo quando as rainhas estão interagindo em determinados momentos. E entendo que ele seja importante para a eliminação, pois as drags usam o cartão para validar sua passagem e as eliminadas são barradas, mas nesse sentido gostaria de ver uma eliminação mais dramática, mais teatral, algo bem CAMP (exagerado) mesmo.
Imagina as drags na berlinda dando sinal para o ônibus e ele parando apenas para as salvas, ou as drags eliminadas correndo atrás do ônibus enquanto ele se perde de vista. Poderia rolar até uma encenação com um manequim usando as roupas da eliminada e sendo jogado para fora do ônibus tal qual o Jazzy no “O Maluco No Pedaço” toda vez que era expulso da mansão dos Banks. É camp, é drag!
PONTOS POSITIVOS
Cada episódio começa com o CLOSE, um mini desafio, e até agora eu AMEI os propostos. Especialmente o do segundo episódio, em que todas as rainhas chegam vestidas de vermelho para o festival do tomate e fazem uma música muito gostosa sobre isso. Mesmo que várias tenham feito rap para um som sertanejo, o resultado final me agradou, e o clipe? LUXO PURO! Somente nesse mini-desafio, que poderia muito bem ser um desafio principal, tivemos um vislumbre de como nossas rainhas são habilidosas.
Assim como o mini-desafio do terceiro episódio, em que as drags tiveram que fazer looks com materiais não convencionais, costurados e colados em apenas uma hora e meia. Eu achei a maioria lindo!
Ou seja, nem todas são costureiras, cantoras ou compositoras, mas serviram como grandes profissionais. E isso prova que nossas drags precisam é disso: oportunidades e orçamento, pois se por anos entregaram tanto, mesmo com tão pouco, o céu é o limite com uma grande plataforma por trás lhes dando suporte.
Quanto aos desafios principais, eles não são ruins, o problema mesmo é sua edição breve, se o episódio fosse maior poderíamos ver mais das drags em ação e com certeza aproveitar mais o show. Tirando o bate-cabelo do episódio 1, o show de humor e especialmente o show de talento único foram melhor apresentados. Eu ri e vibrei demais com cada drag servindo sua peculiaridade no palco.
E que palco, né? A produção de Caravana é grandiosa. E ter o público ali assistindo e vibrando com tudo é um elemento essencial para que a gente se empolgue ainda mais, sabendo que as rainhas estão recebendo a energia que precisam para darem o seu melhor.