Rafael Suriani iniciou sua carreira como artista de rua em 2002 ainda em São Paulo, onde nasceu. Desde 2013, ele se dedica a pintar drag queens nas ruas da França, Estados Unidos e Brasil. A mini-biografia em seu site oficial diz que “seus retratos de drag queen são uma manifestação da necessidade de capacitação das comunidades queer urbanas contemporâneas”. Com um trabalho mundialmente conhecido, e querido entre as drags brasileiras e internacionais, Suriani se prepara para lançar o livro Street Queens, um projeto financiado coletivamente e que busca juntar a arte urbana e a diversidade em prol da mesma causa artística.
Eu tive o prazer de conversar com Suriani (de quem sou muito fã sim) sobre sua carreira, curiosidades, RuGirls, e o projeto do livro – que oferece recompensas incríveis para quem colaborar.
Giulianna: Eu li que você começou a pintar drag queens nas ruas da França por considerar que o país estava regredindo nos direitos dos LGBTQ+. Isso foi em 2013, certo? Você chegou a sofrer alguma represália por causa disso? Sente que a França evoluiu nas questões dos LGBTQ+ durante esses cinco anos?
Suriani: Em 2013, foram votadas na França leis como o casamento de pessoas do mesmo “sexo” e a possibilidade de adoção por casais homossexuais. Surgiu também a proposta do ensinamento da teoria de gênero nas escolas. Esses avanços causaram debates na esfera pública e grandes manifestações conservadoras tomaram as ruas de Paris, em oposição. Isso foi um choque para a França e para o mundo, que sempre considerou o país como sendo avançado em questões morais e políticas. Comecei a pintar drags nas ruas como uma forma de resistência. Se eles estavam indo pras ruas manifestar, resolvi usar o meu universo da arte urbana para expressar os valores em que acredito. A cultura drag representa muito do que defendo, que é a liberdade de expressão e experiência de gênero, aceitação da diversidade e muita positividade!
G: Fale um pouquinho sobre a sua trajetória com a arte urbana. Quem são suas principais referências no mundo do grafite?
S: Comecei a fazer arte nas ruas de São Paulo em 2002 quando ainda era estudante de arquitetura na USP. Nessa época eu fiz uma pesquisa de iniciação científica sobre arte pública e me inspirei no boom do grafite em São Paulo. Os artistas que me inspiraram nesse momento foram os Gêmeos, Nunca, Nina, que estavam fazendo grandes murais pela cidade. Meu trabalho final na faculdade de arquitetura foi sobre arte urbana, assim como o mestrado que fiz em Paris. Difícil citar os artistas que me influenciam, são muitos! Desde Keith Haring com seus murais políticos nos anos 80, passando pelo grafite e pela pixação de São Paulo, que fazem parte da paisagem, até os artistas parisienses de quem fiquei amigo chegando na França…
G: Como surgiu o seu interesse pela cena drag? A sensação que você teve ao conhecer as primeiras drag queens pessoalmente ainda se mantém quando você conhece drags novas? Ainda sente certo deslumbre e encantamento ou, com o passar do tempo, isso diminuiu?
S: O interesse pela cena drag surgiu quando comecei a frequentar a cena “GLS” noturna paulistana no final dos anos 90. Ia em clubes como A LOKA, Lov.E, Pix… As drags sempre me impressionaram pela coragem de expressar nos clubes e nas ruas todo esse universo queer cheio de brilho e cores! Já naquela época eu as via como heroínas da comunidade LGBT+. Seres destemidos e exuberantes, com poder de representatividade e combate! Ainda tenho esse fascínio e é isso que me inspira e me leva a seguir com este trabalho.
G: Eu sei que muitas RuGirls te adoram e admiram seu trabalho. Você tem alguma história legal pra contar sobre alguma delas?
S: Acho que o mais legal foi quando a Willam fez um bate-volta de Londres pra Paris só pra me conhecer e ver suas pinturas na rua! Ela só ficou umas 3 horas na cidade e voltou pra Londres pra performar à noite! Não quis nem ver a torre Eiffel hahaha. Foi muito bacana conhecê-la pessoalmente e foi aí que eu percebi o quanto meu trabalho toca as pessoas que retrato!
G: Tenho certeza que você tira muitas lições trabalhando com drag queens, por ser uma arte extremamente rica, criativa e política. O que você aprendeu com elas e como isso afetou sua vida?
S: Acho que o que mais afeta minha vida são os amigos que tenho feito ao longo dessa aventura. Tanto em Paris como em São Paulo, tenho o prazer de conhecer artistas fascinantes com quem me identifico por fazerem uma arte alternativa e política, que busca fazer a diferença na vida das pessoas. Esses encontros e parcerias são muito enriquecedores!
G: E vamos falar do livro Street Queens! São mais de 150 drags retratadas nele, entre brasileiras, americanas e francesas, certo? Tem artes exclusivas que foram feitas somente para o livro? Você pretende lançá-lo só no Brasil ou em outros países também?