Ela abriu a Caixa de Pandora, mas em vez de todos os malefícios do mundo, ela libertou para a humanidade, além da esperança, uma drag queen que ama ervilhas e pênis, não ao mesmo tempo. Pandora Boxx é a convidada de hoje desta edição da Who’s That Queen?
E para falar dela, que é tida por RuPaul como a Susan Lucci do drag, a atriz americana que foi indicada 19 vezes ao Emmy para enfim ganhar por seu papel na novela All My Children, precisamos nos ater a Michael Steck, a pessoa que dá vida à Pandora e se identifica como gênero fluido.
Nascido no dia dois de maio de 1972, em Jamestown, Nova York, Estados Unidos, Michael desde sempre fora o protótipo da criança LGBTQIA+, daquelas que dublam Madonna no quarto imaginando uma performance com tudo que se tem direito. Assistir muita televisão ajudou sua mente a ficar cada vez mais imaginativa.
Sendo assim, naturalmente ele ia criando seus primeiros personagens para as peças teatrais que escrevia enquanto brincava com as bonecas Barbie e Moranguinho de sua irmã. Ela o acompanhava nos shows de fantoches que eram apresentados para seus pais. Michael, não satisfeito, também fazia os próprios bonecos artesanalmente. A criatividade explícita lhe faria viver uma situação que, apesar de precoce, é inesquecível por natureza.
Em 1977, Michael tinha cinco anos e sua mãe fez uma foto dele montado como drag queen. A peruca usada para o registro foi jogada fora logo em seguida, no entanto, a experiência de ‘viver uma personagem’ não pararia por aqui, porque ele apresentou uma peça autoral, na quinta série, para todo o colégio. Mas atuar não era seu único interesse, não.
Cria da televisão, Michael credita a ela seu senso de humor. Aliado a isto, sua mãe é conhecida por ser engraçada e ele se sente, desde sempre, conectado com mulheres comediantes. Explorar a comédia seria importante para enfrentar um inimigo comum de pessoas gays. O bullying.
Diariamente Michael era importunado por alunos preconceituosos que tornaram sua vida escolar algo difícil, porém, ao descobrir-se uma pessoa com veia cômica, deduziu que utilizá-la seria a melhor forma para combater a homofobia. E assim foi até sua formatura e é aqui que as coisas começam a ficar mais interessantes.
Logo após concluir o ensino médio, Michael participou de uma festa com temática drag que alguns amigos estavam envolvidos. Por lá ele estreou como drag, sendo montado por outra rainha, mas a experiência não foi o que podemos chamar de memorável. Nesta época, Michael namorava o ex-namorado da mesma drag que o montou pela primeira vez, então, por aí você consegue imaginar qual foi o resultado, visto que o parceiro de Michael descobriu que não era ex. Não totalmente, pelo visto.
De qualquer forma, agora uma drag queen, de onde veio seu nome? Obviamente, do mito grego. Segundo Pandora já contou à imprensa, chamando-se assim ela garante o elemento surpresa, pois as pessoas não sabem o que esperar. Nesta fase inicial, as reações ao seu novo trabalho foram mistas.
Os pais de Michael levaram um tempo para entender, mas a mãe aderiu a ideia depois de ganhar tratamento VIP na boate em que o filho trabalhava. Os amigos, apaixonados por teatro como ele, acharam diferente e por isto mesmo adoraram. E um deles, em especial, ajudou a definir os rumos do futuro profissional da baby rainha que dava seus primeiros passos.
Darienne Lake, Rugirl da sexta temporada de RuPaul’s Drag Race, certa vez fez um show ao ar livre em Rochester, Nova York. Michael estava na plateia e assistiu tudo fascinado, típico de um espectador de primeira viagem. A esta altura ele não imaginava que fosse possível fazer uma carreira como drag. Como viu que era possível, foi lá e o fez.
A história de Pandora Boxx começa neste momento, no bar gay Infinity, local no qual ela usou pela primeira vez o nome pelo qual você a conhece hoje, caro leitor. E estamos falando de uma drag que começou a se montar também porque queria ser como aquelas mulheres bonitas da TV que não se escoravam só na beleza, e sim no senso de humor.
Neste balaio, surgem nomes como as atrizes Goldie Hawn, Cameron Diaz, Jenny McCarthy, Carol Burnett, Lily Tomlin, Madeline Kahn e Beatrice Arthur. Todas elas e mais algumas, do passado ou contemporâneas, conhecidas pelo caráter cômico, ajudaram a criar a Pandora Boxx que agora você está conhecendo melhor. E ela tem mais histórias para contar.
Enquanto prosseguia “experimentando” drag, Pandora não ocupava todo o tempo de Michael devido a sua vida no horário comercial. Fotógrafo e editor de vídeo, acabou deixando o trabalho tempos depois, para se dedicar integralmente ao drag.
Os anos se passaram, Pandora, que sempre morou no subconsciente de Michael desde os tempos de infância, aprendeu novos truques, aprimorou outros detalhes de sua drag, mas algo não encaixava. A carreira não ia para a frente. O ápice da frustração aconteceu no início de 2009 quando, em meio a muita energia negativa e dúvidas, Pandora cogitou sair de cena e parar de vez de ser uma fake lady. E agora?
Bom, ao perguntar as Deusas do universo se deveria manter suas calcinhas lavadas para uso, como toda boa senhora falsa, Pandora obteve uma resposta que lhe fez enterrar de uma vez por todas a sensação de que, na verdade, ela não estava progredindo: RuPaul’s Drag Race.
Motivada a levar sua drag para o próximo nível e curiosa para saber se uma audiência maior reagiria bem ao seu trabalho, Pandora tentou fazer parte do programa de RuPaul duas vezes, o que resultou em sua participação na segunda temporada, gravada nos meses de julho e agosto de 2009.
Quando soube que havia conseguido entrar para a família Rugirl, Pandora saiu dançando pela casa uma playlist com suas músicas comemorativas prediletas. A euforia em breve seria substituída pelo cansaço dos longos dias de filmagens da temporada, os quais ela define como ‘uma prisão de alta costura’.
Eliminada em quinto lugar, Pandora passou um dia inteiro filmando sua eliminação, após o desafio do makeover onde, segundo os jurados, ela tinha sido ofuscada por sua mãe drag. Como consequência, uma dublagem pela vida contra Jujubee e o temido Sashay Away ao final do dia.
Apesar do desfecho diferente de sua fantasia original, Pandora pode bater nos peitos de plástico e se orgulhar de sua passagem por este reality show. Seja com a representação de Carol Channing no Snatch Game, fazendo um relato sincero de sua tentativa de suicídio ou registrando uma saída de cena nada esquecível, Pandora, veja só, Dragliciosa, fez valer o tempo de tela. E você sabe que não para por aí.
Infelizmente, a segunda passagem de Pandora pelo Ruverso é aquilo que é considerado um tabu pela base de fãs brasileira: All Stars 1. Nele, em dupla com Mimi Imfurst no time Mandora, a dupla acabou sendo a primeira eliminada e nós não precisamos pesar o clima por aqui, não é?
Recentemente, confirmando a teoria de que a boa filha a casa torna, Pandora cravou sua terceira passagem pela maior competição drag mundial, ao ser a oitava eliminada da sexta temporada do All Stars. Quando perguntei para ela, antes do elenco desta season ser anunciado, se voltaria ao programa pela terceira vez, tive a seguinte resposta:
“Talvez seja uma, duas, três vezes uma senhora falsa. Ha! Eu definitivamente consideraria voltar. Seria estranho voltar depois de tanto tempo, mas há muito mais pessoas assistindo agora”.
E como você sabe que Pandora está no embalo dos holofotes, seu primeiro álbum acabou de ser disponibilizado nas plataformas digitais. Todos estes feitos contrariam o pensamento de que, no mundo do entretenimento, o comediante é sempre esquecido, afinal, Pandora, você é engraçada, indiscutivelmente talentosa e… O que mais? É o que você descobre logo abaixo, na íntegra, na entrevista que fizemos. Confira!
Ser engraçada é um de seus maiores traços. Como fazer para surpreender o público que já espera que você o faça rir?
Eu choro. Estou brincando! Sempre acreditei que você deve dar ao público o que ele quer, então tento fazê-lo rir.
Como a primeira Rugirl a usar um bordão na entrada em RuPaul’s Drag Race, como você vê as que fazem isto hoje, 13 temporadas depois?
Eu nem percebi que era a primeira Rugirl a ter um bordão entrando na sala de trabalho. É muito divertido saber disso. Acho que alguns bordões funcionam e outros não. Mas agradeço o esforço.
Depois de 166 Rugirls serem apresentadas ao mundo ao longo de 13 temporadas americanas de RuPaul’s Drag Race, quão desafiador é permanecer relevante no meio de tantas drag queens?