Esse é o último “Alô peruas do meu Brasil” da temporada. Apesar do clima ser de festa, já começo a resenha com o coração pesado por ter de me despedir de artistas e juradas tão talentosos, que nos ajudaram à atravessar parte da quarentena deixando as noites de terça/quinta muito mais leves. Dito isso, podemos finalmente celebrar o encerramento da segunda temporada do The Next Talent Drag. Já adiantando, para quem ainda não viu, que a qualidade está altíssima e a competição acirrada.
Como temos trabalhos extensos, na resenha de hoje vamos ser mais diretos. O episódio que marca a final desafia as queens à criarem seu próprio curta, tendo que atuar, dirigir e roteirizá-lo, tudo isso, inspirado em diretores consagrados, onde cada competidora poderia escolher um para apoiar seu trabalho. Bem, sabemos que toda estreia cinematográfica que se preze tem um tapete vermelho. No TNT não foi diferente. Antes dos curtas serem apresentados as queens e os jurados desfilaram no tapete vermelho mostrando seus melhores looks.
👑FASHION QUEENS DA SEASON👑
👗Look das outras duas finalistas do TNT para a grande final, Organzza e Slovakia!
🧚♀️Qual a favorita de vocês? Quem merece Toot? Oraganzza, Slovakia ou ambas as queens? pic.twitter.com/LGJDzNas2l— draglicious.com.br (@dragliciouz) April 22, 2021
Enquanto Organzza apareceu com o mesmo vestido, ou uma versão muito parecida, que usou no Ball. Slovakia entrega sua melhor versão. Ambas lindíssimas, Organzza trás consigo o trunfo de referenciar o seu ponto alto na temporada, já Slovakia aproveita de sua estética única para apresentar um visual clássico de seu universo tão reconhecível pelos fãs.
👗Look das finalistas Katrina Addams e Lilith Prexeva para o carpete vermelho da grande final!
🧚♀️Qual a favorita de vocês? Quem merece Toot? Lilith, Katrina ou as duas? #TNTDrag pic.twitter.com/5D6UprcUzJ— draglicious.com.br (@dragliciouz) April 22, 2021
Katrina Addams e Lilith Prexeva também imprimiram suas identidades em seus looks. Katrina como a rainha gótica que conhecemos e amamos. Lilith a louca com combinações que só ela poderia usar e nos encantar. Além dos looks, no tapete vermelho, as queens tiveram de responder perguntas feitas pela DaCota, todas foram hilárias e conseguiram mostrar um pouco mais de seu humor.
Agora, a parte que mais interessa, os curtas individuais. Antes de tudo, é necessário ressaltar a dificuldade técnica dessa prova final, o fato de todas as quatro queens entregarem um trabalho bom já mostra muito empenho e profissionalismo. O primeiro curta exibido foi o de Katrina Addams, a rainha se inspirou nos filmes do diretor Tim Burton. Essa foi uma escolha em certo ponto previsível mas, inegavelmente, é um casamento harmonioso. Trabalhando com a estética burtoniana Katrina está em seu universo gótico e dramático com uma série de ferramentas que a ajudariam a compor seu trabalho.
Em Desaparecida, Katrina conta a história de um casal em que a garota foge de um encontro rumo ao desconhecido, seu namorado então passa a procura-la pela cidade até encontrá-la em forma de sereia, indo em sua direção rumo ao seu possível fim. Esse foi um bom trabalho, com uma história simples e escolhas medianas. Eu até acredito que no mundo de Tim Burton cabe o cinema mudo, assim como já sabemos que ele é cheio de casais apaixonados com histórias trágicas. Porém, há tantas características que poderiam ser incorporadas para reforçar a referência que ultrapassam o estético. Uma delas, talvez a mais questionada por quem acompanhava o ao vivo no youtube, foi a ausência de trilha sonora. A história já era simples e caminhava para um final previsível, uma trilha talvez traria o drama necessário para acrescentar camadas na obra.
Katrina, possivelmente decidiu por tomar um caminho original, o que tornou seu curta mais sensível e íntimo. Isso é positivo por um lado, artisticamente falando você tem muito mais Katrina Addams do que outro criador, mas quando analisamos com os outros três trabalhos da noite e a proposta feita pelo programa Desaparecida realmente desaparece de nossas memórias.
Katrina Addams em seu curta, inspirado nas histórias de Tim Burton, apresentou um trabalho sensível e silencioso.
Você é #TimeKatrinaAddams? #TNTDrag pic.twitter.com/4PfdS5ddfr
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O Segundo curta apresentado é Adeus Paraíso, por Lilith Prexeva, inspirado nas histórias do diretor espanhol Pedro Almodovar. Para começar, acredito que a intercessão do trabalho desses dois artistas é, como se pode imaginar, uma odisseia louca e colorida com idas e vindas. E é isso o que Lilith entrega. A queen chega na final como uma das favoritas, suas vitórias foram construídas em desafios de humor e ver o que ela poderia fazer com mais tempo de tela em uma história autoral é a realização de um sonho.
Sobre o Adeus Paraíso é preciso ressaltar o bom uso de diversas ferramentas que unidas deram o toque “Almodovar” à produção, como a trilha sonora que começa com um angustiante “tic tac”, a cores gritante, os cortes rápidos de cena que guiaram o ritmo do curta encerrando abruptamente as pausas longas dos monólogos. Lilith é muito inteligente e sua escolha de recontar a história da própria Lilith bíblica nesse contexto é genial, isso já nos livra de apresentações e da mais tempo para que as peculiaridades de sua releitura sejam exaltadas.
É evidente o quão pessoal e espirituoso esse curta foi. A entrega de Lilith Prexeva é o ponto alto de Adeus Paraíso, cada personagem aparece com uma voz e energia extremamente distantes, como a abobada Eva, o intenso Adão, a maliciosa cobra do paraíso de Lilith e a própria, que teve espaço para variações de gênio mesmo com tão pouco tempo para desenvolver-se. No fim temos uma verdadeira obra de arte que quebra nossas expectativas, tivemos a maluquice e escracho de Prexeva, mas o gosto que ficamos na boca foi de sua versão fatal e profunda, que não destoa de todas as outras apresentadas, ela chega para somar.
Lilith Prexeva em seu curta, inspirado nas histórias de Pedro Almodovar, apresentou um trabalho intenso e com um ritmo surpreendente
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O próximo curta para analisarmos é A Mocinha e o Mambembe por Organzza, inspirada nos filmes do diretor pernambucano Guel Arraes. Durante as lives que antecederam a final, Organzza contou sobre sua paixão pelo diretor e seu favoritismo pelo filme ‘Lisbela e o Prisioneiro’. O filme de 2003 pauta toda a história contada no curta produzido pela queen, temos claras referências e cenas até idênticas à produção, tudo muito bem aproveitado. Aqui, Juliana é uma jovem noiva apaixonada pelo teatro e que, sob os cuidados de seu cauteloso pai, se prepara para seu casamento com o ciumento Cleiton, seu noivo um dia decide ir ao teatro para descobrir o que tanto chama a atenção da moça, lá o noivo se apaixona por um dos atores e no dia do seu casamento decide fugir com o intérprete de Romeu.
Esse foi, entre os quatro curtas, o que mais aproveitou da fonte do diretor escolhido. O que era exatamente a proposta do desafio. Deixando para Organzza o trabalho de costurar essas escolhas em uma peça única. E sabemos que a rainha costura muito bem. Tendo o teatro como um guia estético e também como o centro físico da narrativa, o curta de Organzza é visualmente impecável. Os figurinos são de cair o queixo, todos muito bem trabalhados e ainda cumprem muito bem a função de nos transportar para aquele mundo caricato e irônico onde a história se passa. Algumas escolhas também reforçam o bom gosto e o toque artístico da produção, como partes trocadas do figurino, enquadramentos do movimento das mãos (característica que geralmente é perdida na tv e cinema) e os manequins que contracenam com a competidora ao longo do curta.
Organzza consegue acertar todas as piadas, figurinos, personagens e intenções. Esse foi seu melhor trabalho da temporada inteira, nos deixando satisfeitos com o emprenho da concorrente enquanto multiartista. Acredito que o ponto principal de ‘A Mocinha e o Mambembe’ é o ritmo que aqui foi guiado pelo humor. Os diálogos rápidos, brilhantemente acompanhados pela câmera, são todos pontuados com um humor crescente e delicado. Essa característica ainda é a base para o encerramento do curta, que fecha de forma engraçada e leve.
Organzza em seu curta, inspirado nas histórias de Guel Arraes, apresentou um trabalho esteticamente bem pensado e divertido.
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Por fim, temos Slovakia. A queen teve como base os filmes de Guilherme Del Toro e dele absorveu as grandes aventuras e personagens fantásticos. Conceitos que foram muito bem adotados e também são visíveis dentro das propostas que a participante apresenta dentro e fora da competição. Em Para Onde Vou? (tenho roupa para isso?) Slovakia mergulha no multiculturialismo para contar a história pós vida de uma drag queen que se encontra com uma entidade aracnídea responsável por apresentar sua versão de céu e inferno, o magnífico porém cheio de cobranças paraíso de Bollywood ou o purgatório barulhento e caótico do aniversário do supermercado Guanabara.