Canada's Drag Race

Who’s That Queen? Anastarzia Anaquway

“Drag abrange um espectro tão amplo. Drag Race, por outro lado, é predominantemente uma indústria branca”, diz Anastarzia Anaquway nesta entrevista exclusiva.

🕓 10 min de leitura

Anastarzia Anaquway registrou uma passagem breve na primeira temporada de Canada’s Drag Race, no entanto, não fora o suficiente para lhe impedir de ser emblemática, afinal, ela entrou e saiu do programa impondo marcos, visto que é dela o título de primeira drag queen das Bahamas a participar de RuPaul’s Drag Race e todos os seus spin-offs derivados, além de ser a única Rugirl a não deixar uma mensagem de despedida, escrita com batom, no espelho da sala de trabalho.

Sim, Starzy fez suas próprias leis no Ruverso, porém, entre ser a quinta rainha a entrar na competição e deixá-la como a terceira eliminada, toda uma história foi feita e não é assim que ela começa, pelo menos não nesta edição de hoje da Who’s That Queen?

Jermaine Aranha nasceu no dia 21 de janeiro de 1982, em Nassau, nas Bahamas. Durante a infância, sua criação religiosa, do tipo que o fez decorar salmos e provérbios bíblicos, naturalmente o encaminhou para cantar no coro da igreja.

Ao lado desta atividade, ele também acompanhava horas intermináveis de videogame com seus primos que, diariamente, jogavam Mortal Kombat, Street Fighter e Super Mario Bros. Nas poucas vezes que se juntou a eles, Jermaine optava por brincar com personagens femininas, como Chun-Li.

Este interesse específico tem a ver com uma característica que ele tem desde criança: a curiosidade de saber como as coisas funcionam, algo que o levou para o mundo acadêmico, no qual estudou administração de construção na universidade, uma experiência importante para quem ama trabalhar com as mãos e para a grande reviravolta que Jermaine viveria no futuro.

O ano é 2002 quando, nas Bahamas, a drag queen local Victoria Diamond participa de um desfile de moda. Jermaine, que até então nunca havia visto uma drag, caiu de amores e passou a se imaginar como uma. Envolvido com artes performáticas anteriormente, ele precisava experimentar se montar para ver no que daria, e assim o fez, no Rainbow Ball, durante o verão.

Seu nome artístico remete a sua infância, uma homenagem à Anastasia, da Disney, um de seus filmes preferidos, lançado em 1997. Na sinopse, sua família é assassinada na Revolução Russa e a princesa se vê forçada ao exílio, retornando anos depois, através de dois russos que procuravam a neta da grã-duquesa imperial, que estava radicada em Paris e acreditava que ela estivesse morta. Finalizando, a palavra star foi adicionada, uma alusão ao fato de sua mãe, desde sempre, dizer que o filho seria uma estrela. O sobrenome é um neologismo criado no meio do expediente formal de trabalho, fora do drag.

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Devidamente batizada, Anastarzia, no inverno de 2002, concorre no Miss Bahamas e, como drag pela segunda vez, sagra-se a vencedora do certame. A felicidade e euforia da nova carreira, todavia, seriam acompanhadas, anos depois, por emoções que testam os limites de qualquer ser humano.

Em 2009, ao lado de seu colega de quarto no apartamento em que moravam na época, Jermaine e ele foram atacados por quatro homens. Guiados pela homofobia, eles contaram com o aval da polícia para cometerem crimes, visto que ela não leva à sério denúncias de pessoas LGBTQIA+, o que faz com que relatos como estes não sejam únicos.

Segundo a própria Anastarzia já declarou à imprensa, os homofóbicos se sentem confortáveis nas Bahamas devido ao mau uso da Bíblia e da religião como um todo, um fator que ajuda a aumentar os casos que, infelizmente, muitas vezes nem chegam a ser noticiados.

Desta forma, o Estado falhou em julho de 2013, quando Jermaine foi atingido com três tiros no braço esquerdo, peito e rim direito, disparados por uma dupla escondida na garagem de sua casa, esperando-o para agredi-lo até a respiração parar. Machucado fisicamente e psicologicamente, ele conseguiu a proeza de dirigir sozinho ao hospital, onde a equipe médica chegou a suspeitar que o óbito viria logo, ainda pelo turno da noite.

Contrariando as previsões negativas, Jermaine felizmente viveu. Motivado por este acontecimento e pelo assassinato de gays e drag queens ao saírem de casa, resolve fazer o melhor por si mesmo: abandonar às Bahamas. Instruído por um amigo que soube de tudo que ele passou e que havia migrado para o Canadá, resolve pedir asilo neste país e o consegue em 29 de setembro de 2014.

Em Toronto, Anastarzia participou de uma infinidade de concursos, venceu vários, mas, apesar de estar na cena drag de sua nova morada, baseia sua agenda de trabalho nos Estados Unidos, local onde atualmente é a Miss Black Continental at Large, concurso sediado em Atlanta. E não pense você que ela parou por aqui, não.

Detentora de mais de 15 títulos, Anastarzia já foi Miss Styles Bahamas, Miss Canada International, Miss Opulence Toronto (2017-2018) e Miss Gay Toronto, entre outros não menos interessantes. Ao lado de tudo isto, ela também pertence a cena de bailes, um lugar que a inspira, por exemplo, a confeccionar roupas.

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Anastarzia começou a costurar em 2012, como consequência da falta de responsabilidade dos designers. O que iniciou como falta de opção e pura necessidade, acabou virando economia, oportunidades, porque ela passou a fazer seu vestuário, como na vez em que encontrou uma motocicleta velha próxima ao lixo, a desmontou e, apaixonada por trabalho manual, transformou um veículo numa fantasia para baile. Este talento seria amplamente utilizado mais à frente, na aventura chamada Canada’s Drag Race.

Estreado em dois de julho de 2020 com o episódio Eh-Leganza Eh-Xtravaganza, o primeiro desafio, Canuck Couture Fantasy, pedia a feitura de um look de alta costura com materiais disponíveis nas caixas O, Canada. Kyne venceu o mini desafio, portanto, escolheu as caixas de suas 11 concorrentes. Para Anastarzia ela deu a Canada Gay que, horas depois, acabou sendo salva ao final do dia.

Na sequência, em Her-Itage Moments, transmitido no dia nove de julho, Anastarzia começa bem o episódio dois, afinal, ela ganhou um vale de mil dólares canadenses para gastar na Wigs and Grace devido a sua vitória, na companhia de BOA, no mini desafio. Em seguida, é preciso se preparar para o desafio principal: atuar em curtas-metragens inspirados no Heritage Minutes, uma série que conta momentos valiosos da história do Canadá.

Divididas, as Rugirls integraram os times I Smell Burnt Tucks e The Muffragettes. A primeira equipe é a de Anastarzia, com Kiara, Lemon, Rita Baga e Tynomi Banks. A segunda é a da BOA, formada por Ilona Verley, Kyne, Priyanka, Scarlett BoBo e Jimbo. Lemon vence e Anastarzia, novamente, é apenas salva. O que aconteceria na terceira semana competitiva? Alerta de spoiler: Not Sorry Aboot It.

16 de julho deste ano é inesquecível para Anastarzia, por bem ou por mal. Encarregada de compor letra, gravar e performar no palco principal com o grupo The Mooseknuckles, a saber, Priyanka, Rita Baga, Scarlett BoBo e Ilona Verley, Starzy e suas irmãs duelaram contra as The Dwolls.

Momentos depois, na passarela Québec-ky With The Good Hair, as coisas não saíram como o planejado no visual duplo Cousin It/Chun-Li. O plano era, como sugerido por Brooke Lynn Hytes, Mortícia Addams na capa, mas o tempo para finalizá-la foi insuficiente e por isto a personagem dos jogos de luta surgiu em cena.

Por fim, em um bottom dois que facilmente poderia ter sido de Jimbo e Ilona Verley, Anastarzia se viu dublando pela vida contra Tynomi Banks, ao som de Absolutely Not (Chanel Club Mix), de Deborah Cox, a jurada especial deste episódio, uma das testemunhas oculares de seu Sashay Away.

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Caso tivesse chegado ao Snatch Game, duas semanas depois, ela teria feito Cardi B. Como não aconteceu, a história desta Rugirl, em Canada’s Drag Race, por ora, se encerra aqui. Sobre o Ruverso no geral, sabe do que ela se arrepende? De não ter assistido RuPaul’s Drag Race antes de competir na versão canadense. A exceção é a primeira temporada americana, a única que acompanhou. Um “erro” desfeito depois de virar Rugirl.

Nos tempos de hoje, ela não só ganhou uma nova irmandade, como fortaleceu seus laços com o bairro de East York, em Toronto, no qual viveu nos últimos cinco anos. Confirmada na RuPaul’s DragCon LA de 2022, Anastarzia é um case de sucesso, um sinônimo da pessoa que não somente sobreviveu, mas vive e progride.

Por tudo isto é estranho e doloroso saber que às Bahamas a veem como uma mentirosa a ser combatida, afinal, se esta matéria não te convenceu exatamente do contrário, experimente a entrevista abaixo, disponível na íntegra. Certeza que você a elevará mais ainda. Confira!

Ao fazer uma pesquisa básica no Instagram, é possível notar claramente que as rainhas negras tem bem menos seguidores do que as rainhas brancas. Ano após ano é a mesma coisa. O que causa isto, Anastarzia?

Do meu ponto de vista, drag é universal e é uma forma de arte que abrange um espectro tão amplo. Drag Race, por outro lado, é predominantemente uma indústria branca. Quando olhamos para a base de fãs, é bastante evidente. Isso não quer dizer que outras raças não estejam apaixonadas pelo programa, mas a base de fãs é majoritariamente branca. Como a natureza humana tem isso, tendemos a gravitar em direção aqueles com quem mais nos identificamos a caminho dos números das redes sociais.

Como você se sente ao saber que às Bahamas não são um país seguro para pessoas LGBTQIA+?

Honestamente, por algum tempo, toda essa região foi problemática para as pessoas da comunidade LGBTQIA+. Pelo que vejo nas redes sociais e ouço de amigos e entes queridos, há algum progresso que está sendo feito. Estou longe de casa há mais de sete anos e parece que o clima em que se refere a esta questão está começando a mudar. Não me entenda mal, ainda há um longo caminho a percorrer e ainda tem tanto trabalho necessário, pois há um fedor de homofobia e transfobia que existe. Prova disso foi exibida descaradamente nas redes sociais através da reação que veio após o episódio dois, quando falei sobre o ódio que experimentei. Comentários como: “Os tiros deveriam ter sido fatais” e “Se ele voltar, atiraremos nele de novo”. Eu já disse isso antes e continuarei a dizê-lo: seria tolice dizer que um país inteiro é homofóbico, mas seria apenas estúpido falar que não há pessoas homofóbicas nas Bahamas.

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O que as suas quase duas décadas de carreira como drag queen lhe ensinaram sobre você mesma?

Os últimos 19 anos como drag queen me ensinaram que sou louca como o inferno. Aprendi muito sobre mim mesma. Sou muito mais bem-humorada do que me credito, sou espirituosa, talentosa e sou a pessoa mais forte que conheço. A vida, às vezes tem um senso de humor engraçado, jogando obstáculos em nós, e eu sou verdadeiramente grata por ter sido capaz de superar todos esses obstáculos.

Quais são, por ordem de importância, seus três momentos preferidos na primeira temporada de Canada’s Drag Race?

Meus três momentos favoritos seriam a) Entrar na sala de trabalho pela primeira vez. Esta foi uma grande conquista para fazer parte da primeira temporada de Canada’s Drag Race e esse momento foi nossa introdução ao mundo como Drag Race Queens. B) A primeira passarela. Senti uma verdadeira sensação de realização olhando para trás para o casaco puffer inspirado em Raízes Vermelhas e Moncler. Comecei a costurar em 2012 e nunca pensei que seria capaz de construir tal peça de roupa. C) A troca de palavras entre Rita e Jimbo após a Passarela do Concurso… Babyyyyyyyyyyyyyyy, me deu a minha vida!!!

Stacy e Jeffrey não retornarão para a segunda temporada de Canada’s Drag Race. Qual a sua opinião a respeito? Você tem alguma lembrança marcante com eles dois?

Como se refere à Stacy e Jeffrey não voltarem… Eu não tenho opinião porque isso não é algo que eu me importo, não é algo que está em minha mente, não é algo que me afeta. Eu não estive no programa tempo suficiente para ter uma conexão com qualquer um dos dois, para ser honesta.

Quando você relembra da experiência de escrever versos para a música do episódio três (Not Sorry Aboot It), qual é a primeira memória que vem à sua cabeça?

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O desafio do grupo feminino, embora eu tenha ido para casa, foi incrível. Adorei escrever essas letras com a ajuda da minha irmã Scarlett.

Foi sua primeira vez como compositora?

Foi a primeira vez que fiz algo assim, mas foi divertido. Me lembro de ter que escrever poemas na escola, então voltei aqueles dias e consegui estourar isso.

Pretende fazer isto de novo?

Estou 100000000000% ansiosa para fazer isso de novo.

Se você pudesse formar um grupo pop de garotas com mais três drag queens, quem você escolheria e por qual motivo?

Eu sei disso… o nome não seria Mooseknuckles, risos.

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Qual será o nome do grupo?

Não tenho ideia de como poderíamos nos chamar porque gosto mais de hip hop e rap do que qualquer outro gênero. Eu iria com Mónet X Change por causa de sua origem caribenha; minha irmã Kimora Amour, que também tem origem caribenha e é estúpida como o inferno; e por último eu faria com minha velha e boa irmã A’keria C. Davenport, ela é uma selva!

E o nome deste grupo?

Nós seríamos “Turn Up on Isle 12”.

Um filme sobre a sua vida será feito. O que o público descobrirá sobre você que não sabia até então?

Felizmente, minha vida sempre foi um livro aberto, não tenho vergonha de nada do meu passado, nem escondo nenhuma parte de mim de ninguém. Um filme sobre a minha vida só levaria o público a uma versão detalhada das histórias que já foram contadas. Parece chato, mas a realidade é que as histórias de Trial and Triumph [livro religioso, com o subtítulo Stories from Church History] são sempre as que mais nos emocionam, porque todos podemos nos identificar com as tribulações.

Existe um grande preconceito contra pessoas que saem de reality shows quando elas tentam atuar no cinema, por exemplo, ou cantar. Para quem duvida do talento de drags que foram lançadas em RuPaul’s Drag Race, o que você tem a dizer?

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Todos temos direito a nossas opiniões!!! Nunca perco meu tempo ou energia tentando convencer as pessoas de nada. Vivo sem desculpas e faço movimentos estratégicos. Essa é a melhor maneira de ensinar as pessoas ou convencê-las de qualquer coisa. Há uma canção que cantamos quando crianças na Escola Dominical, diz: “Eles saberão que somos cristãos pelo nosso amor”. Não é através das coisas que dizemos, mas das coisas que fazemos. Já sabemos que somos talentosos, brilhantes e incríveis, não há necessidade de provarmos isso, mas apenas para continuar vivendo isso.

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